Nos últimos 40 anos a produção de etanol aumentou cerca de 60 vezes, assim como o volume de vinhaça. Atualmente, para cada litro de álcool produzido no país são gerados 12,4 litros de vinhaça em média, o que significa uma produção de 372 bilhões de litros por ano.
Redução do volume da vinhaça
Alternativas para utilização da vinhaça vêm sendo sistematicamente pesquisadas desde 1950. Na época, o professor Jaime Rocha de Almeida apresentou os resultados dos primeiros estudos de aplicação da vinhaça no solo. Estavam lançadas as bases para a fertirrigação, desmistificando a acidez do solo causada pela vinhaça. Mesmo assim, as aplicações passaram a ser realizadas em áreas de sacrifício às quais eram destinados grandes volumes, chegando em alguns casos a 10.000 m3/ha. Mais tarde, em 1975, o professor Nadir Almeida da Glória estabeleceu as bases para a aplicação racional da vinhaça levando em consideração a sua composição mineral, as características do solo e as exigências da cana-de-açúcar. A partir da década de 1980 houve uma redução significativa nos volumes de vinhaça aplicados no solo, em geral variando de 500 a 2.000 m3/ha.
Com base na capacidade de troca de cátions (CTC) do solo e na concentração de potássio (K2O) da vinhaça, em 2005 a CETESB-SP regulamentou o uso e os limites de aplicação nas áreas cultivadas com cana-de-açúcar reduzindo ainda mais os volumes de vinhaça por ha. E quando o limite de CTC do solo é atingido, a aplicação de vinhaça fica restrita à reposição de 185Kg K2O/ha, extração média da cana a cada corte. Para atender as novas diretivas os custos com armazenamento, transporte e aplicação da vinhaça aumentaram consideravelmente.
A vinhaça tem potencial para repor a maior parte dos minerais retirados do solo pela cana-de-açúcar, mas por não ser distribuída em todo o canavial gera um desequilíbrio entre áreas com e sem fertirrigação. Atualmente, 60 a 70% das áreas de canavial não são fertirrigadas e, por isso, dependentes de fertilizantes químicos para reposição dos minerais extraídos pela cana.
Por sua vez, com a colheita e processamento da cana, estes minerais são exportados para as áreas que recebem vinhaça. Desta forma, as áreas fertirrigadas acabam concentrando os minerais extraídos pela cana de “todo” o canavial. Ou seja, são exportados sais minerais de todo o canavial para as áreas que recebem vinhaça. Aplicações sucessivas de vinhaça podem levar à saturação dos solos como ilustrado na Figura 1. Mais cedo ou mais tarde, este limite de saturação acaba sendo atingido em função das características do solo, da composição da vinhaça e dos volumes aplicados por ha.
Os principais problemas decorrentes da saturação dos solos são: a) salinização e alteração do potencial osmótico do meio; b) toxicidade às plantas causadas por íons específicos; c) prejuízo da absorção de água e nutrientes pelas plantas; e d) desestabilização da estrutura do solo. Por consequência, a taxa de crescimento das plantas acaba sendo prejudicada devido a menor captação de água, gasto de energia para balancear as concentrações de sais nos tecidos vegetais, redução da disponibilidade de energia para promover o crescimento da planta.
Uma destilaria autônoma, com moagem de 2.000.000 ton/ano, produtividade de 80 ton/ha, 133 Kg ATR/ton, área de colheita de 25.000 ha e teor alcoólico de 8,5% (v/v) no vinho, gera um volume de vinhaça de aproximadamente 1.850.000 m3/safra. Considerando um teor médio de 2,5 Kg K2O/m3 de vinhaça, retornam ao campo 4.625.000 Kg de K2O. Se esta vinhaça fosse aplicada com base na dose média exigida pela cultura da cana-de-açúcar (185 kg K2O por ha), a área correspondente de aplicação da vinhaça seria de exatos 25.000 ha. Ou seja, teríamos um equilíbrio entre remoção e retorno de potássio ao canavial, com redução de custos em fertilizantes químicos e mitigação da saturação dos solos fertirrigados.
Para alcançar este balanço entre a extração e reposição de minerais é preciso levar a vinhaça para áreas mais distantes do canavial. Isso aumenta os custos operacionais, investimentos em canais, caminhões, tanques de armazenamento e logística para coordenar o transporte e aplicação da vinhaça. Por outro lado, também há uma oportunidade que é a redução dos gastos com fertilizantes químicos como o KCl.
Isso pode ser resolvido? Sim, concentrando a vinhaça em 20, 30 ou até 50%. Volumes menores permitem ampliar o raio econômico de aplicação no canavial (Figura 2). A vinhaça, distribuída numa área maior, diminui os problemas de saturação do solo além de trazer uma economia em fertilizantes a base de potássio. Para reduzir os volumes de vinhaça algumas usinas têm trabalhado com teores alcoólicos mais elevados na fermentação. Esta redução de volume em função do teor alcoólico está demonstrada na tabela 1. Para isso foram desenvolvidas tecnologias como o ALTFERM® com objetivo de aumentar o teor alcoólico das fermentações, reduzir o volume de vinhaça, diminuir o gasto de vapor na destilaria e o consumo de água.
* Considerando apenas 23% do volume de vinhaça transportada por caminhão e 15 m3 para cada tanque
Fonte: Fermentec
A elevação do teor alcoólico na fermentação aumenta o Brix da vinhaça reduzindo o volume por m3 de álcool produzido. Mais concentrada, a vinhaça pode ser aplicada em áreas distantes do canavial, diminuindo custos com transporte, aplicação e com fertilizantes. Por causa das particularidades de cada usina o aumento no raio econômico de aplicação da vinhaça deve ser determinado para cada unidade industrial.
Em resumo, com menos vinhaça reduzimos o número de carregamentos, tanques de armazenamento, transporte e aplicação em áreas mais distantes do canavial gerando mais economia para a indústria. Por isso, quando falamos do volume de vinhaça, menos é mais.
Autores: Mário Lúcio Lopes, Henrique B. Amorim Neto e Henrique V. Amorim
Fonte: Portal FT agosto/2016